domingo, 19 de agosto de 2012

Olho Nu


Olho
emudecido
diante
da tua nudez.
Espelho
refletido
da face sem rosto:
universo engolindo
o desejo da mudez.

sábado, 11 de agosto de 2012

Ronronar


Doce voz rouca de Bárbara
Em abandono penetra meus ouvidos,
dilacerando o sentimento arrependido,
de quem amou o silêncio daquela máscara.

E esse amor que é enchente e desampara
Corre no sangue feito veneno temido
Que os poetas transformam em crime urdido
Sem assassinos, só transe de doença rara.

Este som dulcíssimo do sofrer que inebria,
Tal qual cachaça servida a ferro em brasa,
fez anoitecer ao sol do meio-dia...

Fez entorpecer os anjos da cabala...
A seiva que jorra como uma hemorragia
Na diluição do que transborda e o silêncio cala.

sexta-feira, 3 de agosto de 2012

O Amor Não Mais Escorria Pelas Paredes


O amor não mais escorria por aquelas paredes...
Antes, elas, as paredes, banhavam-se num suor cálido
E derretia os quadros, os painéis, o lustre, janelas.
Até o Coração de Jesus liquefez-se.
O cadeado da porta escoou lânguido pelo piso do terraço.
Nem mesmo as chaves abriam aquelas portas
Porque tudo se escancarava num dilúvio dentro e fora.
Na liberdade líquida do escancaro.
O amor nos levava qual embarcação
Entre o portão e a cozinha,
Entre a sala e o quarto,
Jardim, sótão, banheiros...
De tanto amor, boiávamos agarrados
Diante de ondas arrebatadoras,
Cuja força nos lançava para longe de nós mesmos.
De repente o amor estancou.
O dilúvio virara deserto.
Icebergs nasceram no centro da sala.
Vulcões adormeceram morbidamente.
O jardim ressecara por nossa incapacidade de ferir o gelo.
Aos poucos, nem embarcações havia mais.
Nadávamos no fio líquido que saía de nossos ventres
E passamos a andar sobre sapatos.
Usar vestidos e ternos e roupas íntimas
(Sim, porque até aquele momento o amor nos deixara nus).
E começamos a construir outras portas
Outras saídas, outros destinos nos lamentos enternecidos.
E o amor, que antes escorria pelas paredes
Tornou-se uma pedra imóvel
Na solidão oceânica de nossos corações.